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De todos os ambientes do AD&D, que é uma sistema de RPG baseado quase que única e exclusivamente no ambiente Tolkieniano, o mais legal e mais interessante é um mundo bastante diferente daquele que Tolkien lançou em O Senhor dos Anéis e The Hobbit, entre outros livros. Bem vindo a Al-Qadim. Você agora está num mundo onde mercenários batalham nos desertos. Onde as cimitarras e adagas substituem as espadas medievais. Onde os senhores feudais dão lugar aos sheiks e califas. Ou você acha que a Idade Média só passou na Europa? Nestas terras, você está no meio de uma aventura das Mil e Uma Noites; a única diferença é que aqui, Sherazade pode ser uma cruel feiticeira que vai enlouquecê-lo com suas histórias; e o Jaffar tem muito mais chances de transformar Aladdin em poeira…
Mas não vá pensando que o heroísmo e a fantasia do AD&D desaparecem no meio do cenário exótico de Al-Qadim. Ao contrário: misture bem todos os hábitos e costumes do Oriente (bem diferentes dos códigos de cavalaria) com alguns elementos clássicos do sistema de RPG: você pode encontrar um elfo passeando por um vilarejo, vendendo ervas raras num mercado ou num bazar; ou um orc numa mesquita juntinho de um troll. Ou você achou que estas raças iam desaparecer do nada? No way! As aventuras de Al-Qadim se passam no mundo de Toril (o mesmo mundo de Forgotten Realms), só que no remoto (sempre é remoto, né?) continente de Zakhara, conhecida como Terra do Destino (Land of Fate). Contam as lendas que uma minazinha chamada Loregiver (‘A Que Dá Conhecimento’) foi aos desertos guiada pela entidade conhecida como Fate (que neste jogo, é feminina).
Lá, Loregiver encontrou um imenso conhecimento e sabedoria, que ela acabou registrando em pergaminhos. Só que estes pergaminhos se perderam com o tempo, e só muitas e muitas gerações mais tarde um garoto das tribos do deserto os achou, e os levou até às cidades. O povo reconheceu a sabedoria do menino (que tinha lido os pergaminhos, né?), e finalmente os povos se uniram, reconhecendo o tal do moleque como o primeiro Grande Califa de Zakhara (leia-se o Fodão de Zakhara).
A frase que abre a matéria (não vou repetir; deixa de ser preguiçoso e vai lá dar uma olhada!) é o que guia o povo de Zakhara; Fate é a grande entidade venerada por aquelas bandas, e o mais legal é que, por causa desta fé toda, todos que acreditam nos deuses verdadeiros (Fate não é uma deusa, é uma entidade; por isso, não é venerada em mesquitas) são considerados iluminados. Ou seja, todo mundo é igual, não existe preconceito em Zakhara. Todas as raças (humanos, elfos, trolls, orcs, gnomos, duendes…) são iguais perante a fé. Somente os forasteiros, que não praticam nenhum tipo de religião, são tratados com desconfiança e pena, por não serem iluminados e por não terem direito ao paraíso da outra vida.
O mais bacana é que os estereótipos básicos de personagens se multiplicam neste jogo. Tipo o ladrão: existem vários tipos de ladrões em Al-Qadim! Desde um batedor de carteiras tipo o Aladdin, passando pelos corsários, até um Holy Slayer, que são fanáticos religiosos, que matam e trucidam em nome da fé. Fora que existe uma puta diferença entre você viver na cidade ou no deserto, porque os costumes são bem diferentes. Aliás, os povos (chamados de Al-Hadhar) que vivem uma vida estacionária, seja numa cidade, numa vila ou numa fazenda, têm uma grande rixa com os nômades (que são chamados de Al-Badia). Talvez esta seja a única forma de preconceito que existe por lá (e mesmo assim, não tem nada a ver com raças, mas com tradiçõesdiferentes). Os Al-Hadhar se consideram mais aculturados e bem-educados que os Al-Badia; estes, por outro lado, se consideram mais livres do que os Al-Hadhar.
Pra se dar bem numa partida de Al-Qadim, você tem de entender um aspecto que é comum a todas as raças e tradições deste continente: a honra. Ser honrado é tudo em Zakhara; tudo que você faz é guiado pela honra, e ser um sujeito honrado é quase a mesma coisa que ser um sujeito bom. Se você arranha a honra de alguém, isto pode ser considerado um crime terrível, algumas vezes pior do que se você tivesse matado uma pessoa – aliás, matar pode não ser tão ruim assim, se for um ato justificado. Existem dois tipos de crimes que podem te condenar à morte: assassinato (sem motivo nenhum) e traição no amor (que pode ou não ser algo físico; um olhar diferente já pode ser considerado traição). Ser infiel é um crime terrível numa sociedade que prega tanto a família como um de seus pilares. O divórcio é legal, e o casamento é o único laço familiar que pode ser quebrado; laços de sangue são muito fortes, e matar um membro da sua família é uma quebra de honra terrível. Todas as religiões pregam a honra, que vale mais do que um donativo a um mendigo, por exemplo. Umritual bastante interessante que prega a tal da honra é o rito do sal. Quando você recebe um hóspede em sua casa, seja ele convidado ou não, você deve oferecer-lhe comida e bebida… mas a partir do momento que ele comer sal de sua mesa, o laço está feito, e o hóspede e o anfitrião se devem um pacto mútuo de proteção e ajuda, por pelo menos três dias (o tempo que o sal estiver no corpo do hóspede).
Para que você entre de cabeça no mundo de Al-Qadim, não basta só ter o módulo básico, tá? É muito interessante que os iniciantes corram atrás de uma caixa chamada Land of Fate, que traz descrições das principais cidades do continente (Huzuz, a capital das terras iluminadas e sede do governo do Califafoderoso, é melhor descrita em City of Delights), as lendas, os outros deuses, o calendário (que não é o romano que conhecemos) e até a língua, Midani, que toda a população fala.
Apesar de você ter gostado da matéria do Tio Cid, e ter ficado totalmente empolgado pra jogar Al-Qadim, é bom que você saiba que a TSR deu fim ao jogo há muito tempo atrás. Pois é: Al-Qadim não é uma ambientação infinita, com novos e novos suplementos sendo lançados a medida que as vendas crescem. Ainda mais depois da compra da TSR pela Wizards of The Coast, e depois da reformulação do sistema AD&D para D&D 3ª Edição e o Sistema D20, as probabilidades de que Al-Qadim um dia retorne são remotas no momento. Mas dizem uns e outros que talvez a WoTC entre numas de lançar, ocasionalmente, novos suplementos e aventuras para este mundo, baseados nas novas edições do D&D, mas não tem nada certo. Pra nós, só resta torcer, e crer que, um dia, alguém aqui no Brasil vai querer traduzir este jogo…
Dica: Além do já citado desenho animado longa-metragem Alladin, da Disney, outra boa fonte de referência é o filme O 13º Guerreiro. É um típico personagem de Al-Qadim jogado no meio de um reino Tolkieniano clássico. Um pusta choque de culturas, por assim dizer!
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