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Um dos nomes mais importantes do nosso bom e velho samba, Paulinho da Viola não poderia ter acertado mais ao afirmar: “Meu tempo é hoje. Eu não vivo do pao é hoje. Eu não vivo do passado, mas o passado vive em mim”. Afinal, o sambista é um verdadeiro tratado vivo do gênero, carregando consigo e mantendo acesa uma boa parte da história de lendas como Pixinguinha, Zé Keti, Dunga, Monarco… No documentário ‘Paulinho da Viola – Meu Tempo é Hoje’, que estréia esta semana no Rio de Janeiro, a diretora Izabel Jaguaribe sintetiza a vida e a obra do cantor de 60 anos, considerado referência até mesmo para seus próprios ídolos – como confessam, em dado momento do longa, os integrantes da Velha Guarda da Portela.
Mesclando as entrevistas conduzidas pelo escritor Zuenir Ventura e as invasões ‘voyeuristas’ ao dia-a-dia do músico, a diretora foca seus esforços em mostrar a delicada relação de Paulinho com o tempo, assunto recorrente em suas canções. Paulinho da Viola é um homem simples, tranquilo, de fala mansa e delicada. Além da música, dedica uma parte do seu tempo à marcenaria. Adora consertar coisas, de cadeiras a carros antigos, um verdadeiro exercício de paciência e prova cabal de que está sempre tentando lidar com a implacável passagem das horas, dos dias, dos anos.
Na verdade, boa parte dos 83 minutos do filme giram, direta ou indiretamente, em torno de uma curiosa afirmação do sambista: “Eu não sinto saudades”. Aos poucos, conforme vamos entrando de cabeça no mundo de Paulinho da Viola, a frase começa a fazer mais sentido. Afinal, ele é pioneiro na arte de manter sempre eternas as obras dos maiores mestres do samba. Como o próprio Paulinho explica, enquanto mantivermos este material vivo, ele não será algo datado, meramente retrato de uma época. “A música é imortal, ganha vida ali mesmo, na nossa frente”, diz.
Para isso, o cantor e compositor torna-se uma espécie de portal do tempo, reunindo ao seu redor diversas gerações diferentes do mundo do samba, transformando-as em uma só. Não são raras as sequências em que vemos, por exemplo, Paulinho tocando um choro ao lado de seu pai, o violonista César Faria, e de seu filho João – que, inclusive, admite ter sido influenciado pelas técnicas do avô. As gerações também se misturam numa grande festa quando Paulinho da Viola se junta a Zeca Pagodinho e aos veteranos da Velha Guarda da Portela numa roda de samba para tocar canções de diferentes épocas. Por sinal, Paulinho da Viola foi o responsável pela reunião da Velha Guarda como um grupo musical, décadas antes da iniciativa da cantora Marisa Monte para relançar os sambistas. Por sinal, a mesma Marisa Monte que tanto sucesso faz nas rádios com o projeto Tribalistas, também entra na máquina do tempo do sambista e canta ‘Carinhoso’ ao seu lado.
Desta forma, Paulinho vai manipulando e brincando com os ponteiros do relógio, dando uma verdadeira aula do que é o samba – e mostrando o quão benéficas seriam as influências de seu trabalho para todo um balaio de grupinhos de ‘pagode’ que apostam em rasteiras baladas românticas. Mas tudo bem: como um hábil manipulador do tempo, Paulinho da Viola vai passando por eles e, enquanto entra para a história, vai deixando os ‘pagodeirinhos de cabelo descolorido’ perdidos no tempo e no espaço… só pra contrariar.
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