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Artigo adicionado em 04/11/2005, às 06:34

Crítica: MARCAS DA VIOLÊNCIA
Não se engane: continua sendo um filme do Cronenberg. E dos bons. Trailer: Alta Resolução | Baixa Resolução (Quicktime) Vídeos: Bastidores | “Who’s Joey?” | “Cheerleader” Juro que, muitas vezes, me pego amaldiçoando baixinho alguns colegas mais… como direi… ancestrais de profissão – aqueles críticos de cinema tarimbados dos veículos mais tradicionais e das mídias […]

Por
Thiago "El Cid" Cardim


Trailer: Alta Resolução | Baixa Resolução (Quicktime)
Vídeos: Bastidores | “Who’s Joey?” | “Cheerleader”

Juro que, muitas vezes, me pego amaldiçoando baixinho alguns colegas mais… como direi… ancestrais de profissão – aqueles críticos de cinema tarimbados dos veículos mais tradicionais e das mídias mais conservadoras, que vivem tentando enxergar detalhes obscuros por baixo da narrativa deste ou daquele cineasta em uma película aparentemente inocente. “Naquela cena de batalha, fulano de tal estava, na verdade, fazendo uma referência velada a administração Bush e também aos hábitos pós-modernos da geração cibernética contemporânea”. Você já não leu isso antes em algum lugar, afinal de contas? 🙂

Algumas vezes, sou obrigado a concordar com determinadas colocações, que acabam saltando aos olhos depois de uma leitura mais cuidadosa. Mas, na maior parte das vezes, a coisa toda parece uma enorme forçada de barra por parte de quem não consegue escrever meio parágrafo sem oferecer uma dúzia de argumentos metidos a “intelectualóides”. Fico sempre com aquela sensação de que os críticos estão vendo coisas nas quais nem o próprio diretor ou o roteirista pensaram.

Mas, no caso de Marcas da Violência (A History of Violence, 2005), a coisa muda completamente de figura. E fica nítido e evidente que, por trás da história de Tom Stall (Viggo Mortensen), o cineasta discorre um verdadeiro tratado sobre a relação do ser humano com a violência, em particular daquela raça difícil de entender conhecida como “cidadãos dos Estados Unidos”. Dizer que é o filme mais “comercial” de David Cronenberg não alivia a barra em absolutamente nada – porque este “Marcas” é intenso, surpreendente, assustador até. Não tem nenhuma mutilação bizarra como em A Mosca, mas a violência é chocante, brutal, crua. Não tem nada de “estético” como na obra de Tarantino. Um único soco, que nas lutas dos Van Dammes da vida em filmecos de ação é quase nada, aqui tira muito, mas muito sangue. E machuca até o público.

“Marcas” também não tem o sexo mórbido e bizarro capturado pelo diretor em Crash – Estranhos Prazeres, mas aborda, entre outros assuntos, justamente a estranha atração que o poder e a violência têm sobre o ser humano.

Construindo uma trama cheia de viradas absolutamente inesperadas e 100% coesa e bem costurada, Cronenberg deu à graphic novel na qual se baseou originalmente, obra de John Wagner (criador do Juiz Dredd) com desenhos de Vince Locke, muito mais vida e solidez, transformando-a numa espécie de faroeste moderno. Tudo vai seguindo bem na pacata vida de Stall, um homem simpático e sorridente que, na pequenina cidade interiorana de Millbrook, Indiana, mora com a esposa, a advogada Edie (Maria Bello, de Assalto à 13ª DP), o filho adolescente Jack e a filhota caçula Sarah. Dono de um pequeno barzinho familiar, ele passa os dias assobiando, servindo café e fazendo panquecas… até que, certa noite, dois tipinhos suspeitos surgem no final do expediente. São criminosos. Querem dinheiro. Estão com a adrenalina a mil. Estão armados. E estão dispostos a dar uns tiros aqui e ali só por diversão. Até que Tom resolve agir. Salta sobre o balcão com agilidade. Toma a arma de um dos sujeitos. E mata ambos a sangue frio, sem errar, com segurança.

Rapidamente, a comunidade alça o homem ao status de herói. E logo ele acaba se tornando atração nacional para os telejornais sedentos de histórias assim – “pai de família salva inocentes de dois bandidos cruéis”. Ser uma inesperada celebridade acaba atraindo tipos ainda mais estranhos ao bar de Tom – especialmente um certo Carl Fogarty (Ed Harris, excelente no papel), mafioso com uma enorme cicatriz no rosto e que afirma conhecer Tom da Filadélfia. E por outro nome: Joey.

A partir daí, a vida da família de Tom vira de pernas para o ar. “Como o seu marido é tão bom em matar pessoas?”, pergunta Carl a uma assustada Edie, em cena já mostrada no trailer. O que é ou não verdade? Quem está certo ou errado? A solução é realmente puxar um gatilho? As viradas mais surpreendentes da história, acredite, não são aquelas que você já começa a imaginar apenas assistindo aos vídeos promocionais. E as discussões que o filme levanta, ora de maneira sutil, ora esfregando sem dó nem piedade na sua cara, são muitíssimo mais pertinentes do que aquelas bobagens discutidas meses a fio todos os dias pelo “Sim” e pelo “Não” no referendo tupiniquim do desarmamento.

O fato é que a violência já faz parte das pequenas e simplórias vidas dos moradores de Millbrook. A chegada dos mafiosos apenas escancara o que os “cidadãos de bem” tanto querem esconder entre quatro paredes. Seja o infalível rifle guardado dentro do armário para qualquer emergência. Ou a risada sincera quando o chapeiro de Tom conta sobre uma de suas esposas, que lhe cravou um garfo no ombro no meio do ato sexual. Ou as implicâncias dos jogadores de futebol fortões da escola com o desengonçado e sarcástico filho adolescente de Tom. Tudo está lá, absolutamente visível. Mas quando Tom ergue a arma em defesa da comunidade, as coisas mudam. Muda o olhar selvagem de Jack para os valentões do colégio. Muda a relação de Tom com a esposa – que, dias antes, se vestira de cheerleader para satisfazer os desejos do maridão em uma tórrida cena com direito até a sexo oral. Como sempre, a direção firme de Cronenberg encaixa detalhe após detalhe sem errar, sem exageros, sem sobras. Cada diálogo, cada seqüência, tudo faz sentido para o resultado final.

Mortensen mostra que, assim como Elijah Wood, conseguiu superar de longe a síndrome de “Senhor dos Anéis”. Aragorn está mesmo no passado. Sem precisar dizer uma palavra, ele protagoniza duas das melhores seqüências de “Marcas” – a primeira, outra caliente incursão sexual, acontece na escada da casa de Tom, e consegue ser brutal e provocante ao mesmo tempo. Já a segunda é a maravilhosa cena final do filme. Sobre esta última, não posso dar maiores detalhes sem entregar mais a respeito da trama. Mas só posso dizer que é simplesmente sublime. Um verdadeiro show de interpretação do núcleo principal que, em silêncio, conseguiu me arrepiar e fazer grudar na cadeira.

Meu saldo final? Um dos cinco melhores filmes do ano, na minha nada modesta opinião. Presença garantida na minha listinha dos “mais-mais” de final de ano aqui d’A ARCA.

::: CURIOSIDADES

– Os nomes dados aos criminosos logo no começo do filme (Leland e Orser) são referência ao ator Leland Orser (o Dr.Dubenko da série “ER”), que viveu um maluco em Seven – Os Sete Crimes Capitais;

– Para a cena de sexo na escada, David Cronenberg estava preocupado com o fato de Bello e Mortensen se machucarem nos degraus de madeira. Ele perguntou ao seu coordenador de dublês se haveria algum equipamento para suavizar o impacto… e o sujeito riu, dizendo que, em vinte anos de trabalho, era a primeira vez que alguém lhe pedia equipamentos de dublês para uma cena de sexo;

– A história de Mick sobre sua esposa cravando um garfo em seu ombro relembra um acidente sofrido pelo próprio Cronenberg nos sets de filmagens de Calafrios (1975), quando a atriz Lynn Lowry fez o mesmo com o diretor;

– A cidade fictícia onde se passa a história foi batizada em homenagem à cidade onde a película foi rodada – Millbrook, Ontario, no Canadá. As cenas que se passam na Filadélfia foram, na verdade, rodadas na cidade canadense de Toronto;

– No gibi original, o nome do personagem principal é Tom McKenna. Não se sabe o motivo da mudança;

– Não pergunte que personagem William Hurt interpreta no filme. É melhor não saber. Só tenha em mente que ele está ótimo.

– Em janeiro, a mesma PlayArte que está distribuindo “Marcas da Violência” no Brasil vai lançar um filme inglês de terror chamado Escuridão (The Dark). Na película, a mesma Maria Bello será esposa de Sean Bean, outro egresso de “Senhor dos Anéis”. E também terá uma filha chamada Sarah. Coincidência pouca é bobagem.

Marcas da Violência (Título original: A History of Violence) / Ano: 2005 / Produção: Estados Unidos / Direção: David Cronenberg / Roteiro: Josh Olson / Inspirado nos personagens criados por John Wagner e Vince Locke / Elenco: Viggo Mortensen, Maria Bello, Ed Harris, William Hurt, Ashton Holmes, Peter MacNeill / Duração: 96 minutos.


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