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Esta eu nem preciso perguntar: mas é claro que você se lembra do Pica-Pau (Woody Woodpecker). Aquele pássaro maluco, de topete vermelho (e, como diria o índio, “e de grande nariz”), safado, politicamente incorreto, que era capaz de devorar uma árvore em minutos? Quem nunca deu umas boas gargalhadas com os desenhos dele, eternamente reprisados na emissora do titio Sílvio? Particularmente, de todos os desenhos clássicos (Tom e Jerry, Flintstones, Jetsons), o do Pica-Pau sempre foi o meu preferido. A marca registrada do personagem era aquela risada estridente, meio irritante, que só ele sabia fazer… mas acabou ganhando dezenas de imitadores com o passar dos anos.
Criado pelo americano Walter Lantz, existe uma lenda por trás do nascimento do pássaro mais mala-sem-alça dos desenhos: estaria Lantz em sua lua-de-mel com a esposa em Sherwood Lake, na Califórnia. O lugar era uma paz só, quando uma pica-pau pentelho começou a bicar o telhado e a fazer um barulho dos diabos. Se a mulher do cara não segurasse a onda, ele teria dado uns tiros no passarinho! Aí, inspirado pela ave estraga-prazeres, ele teria criado o Pica-Pau. O problema é que não dá pra colocar muita fé no que Lantz conta porque, cada vez que ele relatava a história, adicionava um ou outro detalhezinho… Tem mais uma pequena coisinha que talvez prove que tudo era invencionice de Lantz: o Pica-Pau foi desenhado pela primeira vez em 1940, e Lantz se casou só em 1941…
Não importando como diabos ele tenha sido criado, Pica-Pau ganhou as telinhas em 1940, inicialmente como coadjuvante num episódio do Andy Panda chamado Knock, Knock. Quem fazia a voz do bicudo era Mel Blanc, o sujeito que deu voz a vários dos personagens clássicos da Warner Brothers – como o Pernalonga, por exemplo. Este episódio de estréia é aquele no qual o Andy e o pai tentam capturar o Pica-Pau que está enchendo o saco, bicando sem parar o telhado da casa deles (hummm, onde eu já vi isto antes?) e o ursinho tenta colocar sal na cauda do topetudo!
Mas aí, Blanc acabou assinando um contrato exclusivo com a Warner, e o Pica-Pau ficou sem uma voz definitiva. A situação durou até 1952, quando foram realizados alguns testes para a escolha da voz e a mulher de Walter Lantz, a atriz Grace Stafford, entrou anônima nas audições e faturou o papel! Fico só imaginando a cara de pastel do maridão ao descobrir a façanha…
O Pica-Pau faz tanto sucesso exatamente por causa deste jeito porra-louca de ser. Ele rouba gasolina para o seu carro, engana alguns trouxas para conseguir comida e conquista todas as maiores gatas do pedaço – bem diferente dos tradicionais personagens bonzinhos dos desenhos, como o Mickey Mouse, que é a Madre Teresa de Calcutá orelhuda! Quem assistia aos desenhos do pássaro lembra que ele sofreu algumas mudanças com o passar dos tempos. O primeiro Pica-Pau era aquele totalmente pirado, meio esquisito, que mais parecia um cuco com problemas mentais! Ele pulava de um lado para o outro, era o Coringa do mundo das aves. Em tempos de Orkut, ele chegou a ser apelidado, nas comunidades, como “Pica-Pau de polainas”. Aí, aos poucos, ele foi se tornando este que conhecemos hoje, esperto e muito safado – embora, é claro, tenha perdido uma boa parcela do ingrediente “politicamente incorreto” conforme os anos foram passando e o fantasma do moralismo se abateu sobre a indústria americana do entretenimento.
Os coadjuvantes do Pica-Pau também são clássicos: tem o Leôncio (Wally Walrus), aquele leão marinho meio tonto que sempre acreditava ter encontrado a mulher da sua vida quando o Pica-Pau se fantasiava de mulher (lembram da Clementina? “Oh, My Darling Clementine…”). E o arqui-inimigo do Pica-Pau, o Zeca Urubu (Buzz Buzzard), um cara que tinha a manha de ser mais sacana que o protagonista do desenho. Lembram que ele queria vender pro Pica-Pau alguns seguros de vida furados, com uma linhas miúdas que ditavam certas…exceções? E quando ele tentou fazer o Pica-Pau comprar uma fonte da juventude? Mas é claro que o malandrão sempre se dava mal, porque o passarinho sacava qual era a dele e fazia o feitiço voltar contra o feiticeiro.
Anos depois, ainda surgiu outro antagonista, o Zé Jacaré, um crocodilo fanático por comer um fricasê de pica-pau, que chegou até a inventar uma base improvisada da Nasa para abocanhar o topetudo. E não podemos esquecer o próprio Andy Panda; o Picolino (Chilly Willy), um pinguinzinho que acabou até ganhando alguns episódios só dele; o Pé de Pano, aquele cavalo branco que sempre acompanhava o passarinho no velho oeste; e a Minnie Ranheta, uma pentelha que sempre pegava no pé do Pica-Pau e do cachorro dele (aquele que, por sinal conseguia abrir a boca num tamanho mosntruoso). A Minnie, aliás, mulher já foi professora do Pica-Pau, dona da pensão onde ele morava e proprietária do restaurante de beira de estrada que só servia chilli.
Outros que merecem destaque são o corvo Jubileu, que trocou de lugar com o Pica-Pau, indo para a cidade só pra tomar umas porradas de uma velhinha que dava pipocas para os pombos na praça, e o Prof. Hanz Chucrutes, um velho maluco com mania de gênio que caiu com seu foguete que ia em direção a Marte de volta na Terra, e que acabou sendo engabelado pelo Pica-Pau, pensando que ele era um marciano e que aqui era mesmo Marte. E tinha até os sobrinhos do pássaro amalucado que, como em todo bom desenho animado ou gibi, a gente nunca sabe de onde surgiram, já que ele não tem irmãos.
Pra mim, os melhores episódios do desenho são mesmo o do taxidermista, um lobo que faz de tudo pra fazer o penoso ficar empalhado (Dinheiro, mansões, iates, mulheres…) e aquele clássico das cataratas do Niágara, quando o Pica-Pau tenta descer num barril e aquele bando de turistas de capas amarelas gritam “HOO-RAAAAAAAY”. Este último, por sinal, é tão adorado pelos fãs que acabou se tornando tema, aqui no Brasil, de uma manifestação organizada pela internet e que levou uma multidão de gente vestida com capas amarelas a se encontrar, na vida real, só para dar o clássico grito.
Embora só tenham sido produzidos episódios inéditos até o começo da década de 70 (quando começou a perder boa parte da graça), o Pica-Pau ganhou recentemente uma nova versão, cortesia da Fox norte-americana e que já pôde ser conferida por aqui, nas manhãs da Globo. São 13 novos episódios, definidos pela produtora como “uma versão anos 90 do nosso velho e querido Woody”. Tsc, tsc. A verdade é que esta releitura do Pica-Pau não tem metade da graça do anterior. Os fãs estavam mesmo apreensivos, porque afinal de contas, dêem só uma olhada nas cagadas que fizeram ao criar versões anos 90 do Droppy (ficou uma eca, com estilinho detetive e ao lado do filho dele!) e do Tom e Jerry (os dois no cinema, falando e de bem um com o outro! O que é isso?). Prefiro continuar com as reprises.
Ei, a propósito, alguém aí já se perguntou o que diabos o Pica-Pau diz na abertura do desenho, no meio da música e antes de dar sua famosa gargalhada? Guess Who? (Adivinha quem é?).
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