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Você deve conhecer o rosto dele de algum lugar, apesar de não saber o seu nome. Olhe com atenção para a foto ao lado. Coadjuvante frequente de uma série de produções hollywoodianas (de Blade 2 a Alien: A Ressureição), ele já interpretou clássicos de Shakespeare no teatro, já foi ator favorito de dois cineastas franceses e ainda protagonizou, ao lado de Linda Hamilton, a série A Bela e a Fera, sucesso nas telinhas da Globo durante a década de 80. Este é Ron Perlman. E ele chega nesta sexta aos cinemas brazucas totalmente pintado de vermelho e com os chifres cortados em Hellboy, aventura dark adaptada dos quadrinhos de Mike Mignola e dirigida por Guillermo Del Toro.
Para promover a película, o ator de 54 anos veio ao Brasil e atendeu a imprensa numa entrevista coletiva nesta terça-feira (27). Um pouco desconcertado com os flashes, mas bastante simpático e sorridente, ele falou sobre sua trajetória pra lá de eclética. “As falas são secundárias em comparação com o psicológico, com o lado humano do personagem, seja ele criado por Shakespeare ou por Mike Mignola. E personalidade e conteúdo definitivamente não faltam a um personagem como Hellboy”. Segundo ele, o demônio das HQs é um personagem que está sempre rindo, tirando sarro de todo mundo, sem levar nada a sério…exceto o seu amor por Liz Sherman, personagem vivida por Selma Blair. “Aí, ele se torna um adolescente de 14 anos que não sabe o que fazer”.
Segundo Perlman, Hellboy é um personagem mítico, nascido das chamas do inferno para servir o mal e que acaba se tornando um instrumento do bem, sempre fazendo escolhas entre os dois lados. “Guillermo Del Toro o via como um dos maiores heróis da história, por isso ele fez tanta campanha para que o filme saísse”.
Mas, neste processo, Perlman acabou se tornando mais um obstáculo para o diretor. “Ele vinha tentando concretizar este sonho há cinco anos, sempre com a visão de que me teria no papel principal. Ele teve que lutar com muitos executivos que queriam um ator do alto escalão como protagonista”. No final das contas, Del Toro acabou ficando um ano e meio com o projeto parado, até que surgiu alguém que queria desesperadamente trabalhar com ele e topou as suas condições. “Incluindo eu como ator principal”.
No entanto, estar na situação de “eterno coadjuvante” nunca incomodou Perlman, que define a si mesmo como “um ator de personagem”. “Estou satisfeito de ser assim. Sempre fui o amigo do personagem principal, o policial que ajuda o mocinho a desvendar a trama. Nunca quis ser um astro e sabia que Hollywood não ia me transformar numa estrela. Quero papéis interessantes em filmes que tenham algo a dizer”. Mas é claro que ele gosta de ser o ator principal. “É interessante ver tudo girar ao seu redor. Tudo serviu como uma espécie de teste para mim. É um papel voltado para o personagem num filme blockbuster”.
O ator afirma que, apesar de só estar experimentando o gostinho do estrelato agora, sua carreira tem sido ótima. “Não tenho do que reclamar. Foi interessante descobrir que três cineastas encontraram em mim algo suficientemente bizarro e diferente para e dar tamanho destaque: Jean-Jacques Annaud (O Nome da Rosa), Jean-Pierre Jeunet (City of Lost Children) e o próprio Guillermo Del Toro”. Para Perlman, os três têm algo em comum: um coração de um menino de quinze anos. “Os três são muito curiosos, cada um na sua diferente maneira de se expressar. Eles querem emocionar o público, mexer com a platéia, e não comprar uma mansão em Malibu”.
:: DOS QUADRINHOS PARA AS TELONAS
Apesar de interpretar um herói relativamente cultuado pelos fanáticos leitores de histórias em quadrinhos, Perlman admite que não é leitor frequente de quadrinhos. “Mas meu amigo Guillermo Del Toro é fanático o suficiente por mim, por você e por todas as pessoas aqui nesta sala”, brincou ele, apontando para o repórter. “Agora que faço parte deste círculo fechado de aficcionados por quadrinhos, meu amigos me recomendaram muito as obras de Alan Moore. É este o nome dele?”, perguntou. Os jornalistas e leitores de quadrinhos confirmaram. “Pois é, estou lendo A Liga Extraordinária e Watchmen“.
A maior prova da devoção de Del Toro aos gibis foi o fato de que Mike Mignola, criador de Hellboy, esteve presente em todas as etapas do processo, principalmente durante a pré-produção. “Ele chegou até a fazer alguns desenhos de produção, como os da arma e do casaco do Hellboy. Ele até viajou para Praga quando filmamos por lá. Del Toro ficava o tempo todo tentando agradá-lo – eles chegaram até a acompanhar juntos algumas cenas pelos monitores, discutindo detalhes”.
Para assumir o personagem, Perlman precisava se submeter a quatro horas de maquiagem num dia normal e seis horas quando Hellboy estavam sem camisa. “Mas não era um processo desconfortável porque as pessoas responsáveis pela maquiagem vieram da oficina de Rick Baker. Eles são os melhores maquiadores do planeta. Eles conseguem dar vida a um pedaço de látex ou borracha, há uma resposta bastante alquímica entre a maquiagem e o ator”.
Na opinião dele, X-Men é a melhor adaptação de quadrinhos já feita para cinema. “É um filme bem montado, épico, com grandes atuações. Se existe alguma comparação entre X-Men e Hellboy, fico muito feliz porque trata-se de um grande filme”.
Sobre Hellboy 2, cujas notícias já começaram a vazar nos sites especializados, ele brinca. “Neste filme, eu serei a garota”. Falando sério, ele admite que adoraria interpretar Hellboy por quanto tempo ainda fosse possível. “Enquanto ainda puder saltar, lutar, rolar…Não sei se vou ter idade para isso sempre”.
Mas, cercado por jornalistas. Perlman não conseguiria ficar muito tempo falando apenas sobre quadrinhos e cinema. E, encerrando a entrevista coletiva, alguém resolveu lembrar de George W. Bush. “Você não vai conseguir arrancar nada de mim”, gritou Perlman em reposta, brincando. Mais sério, ele confessou ter sua opinião pessoal, mas disse não gostar de falar sobre isso para a imprensa. “Sou só um ator. E este é um assunto para políticos. Não gosto de artistas que usam sua posição para influenciar as pessoas desta forma”.
Mesmo assim, Perlman dá a dica: assistiu ao documentário Fahrenheit – 11 de Setembro, que também chega ao circuito nacional nesta sexta. “Tudo que Michael Moore apresentou no filme parece ser factual e verdadeiro. E espero que tenha sido realmente, porque odiaria saber que mentiram para mim. Fiquei bastante comovido com o que vi e acho que todos deveriam assisti-lo”. Então, fica a dica: nesta sexta, experimente uma sessão dupla, com “Hellboy” e “Fahrenheit – 11 de Setembro”. Você não vai se arrepender.
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