Não se perca, a história do filme é a mais simples possível: uma assassina profissional acorda de um coma e busca vingança contra seu ex-patrão, que a deixou nesse estado em uma tentativa de matá-la. Quando fiquei sabendo que essa era a história de Kill Bill, a mais nova realização do diretor Quentin Tarantino (Pulp Fiction e Cães de Aluguel), fiquei com um pé atrás. Clichezão básico, não? Isso foi o que pensei. Lembrei até de um filme do Steven Seagal que tem o mesmo enredo, pra piorar a situação. E foi justamente isso que me atraiu inicialmente em “Kill Bill”, pois ficava imaginando o que Tarantino iria fazer para que a história não se tornasse algo sem originalidade, enfadonho.
Quando o primeiro trailer saiu, tive a sensação de que seria uma história densa, tão pesada quanto Pulp Fiction, misturada com artes marciais. Porém, me enganei de novo. E isso fica evidente conforme você assiste. Parece que Tarantino fez de propósito ao mostrar um trailer que instiga muito, causando uma sensação quando, na verdade, o filme segue uma direção extremamente oposta: é puro cinema-pipoca, daqueles para desligar o cérebro e se divertir.
Se você vai com a mesma expectativa que eu tive, de ser um filme mais trabalhado psicologicamente, esqueça. Você vai se decepcionar e corre o grande risco de achar o filme uma das piores besteiras já feitas. Porém, conforme os primeiros minutos se passavam, eu entrei no clima do filme com muita facilidade e me diverti muito, apesar de ter quebrado a cara sobre minhas expectativas.
Tarantino é fã confesso de filmes chineses de artes marciais e daqueles seriados bregas dos anos 70 (o filme em si é dividido em pequenos capítulos, como se fosse uma série de TV) e, com “Kill Bill”, o diretor mistura as duas receitas de forma mágica e bem sacada. Fica evidente que o filme não promete revolucionar gênero nenhum e nem ao menos concorrer a algum prêmio, sendo apenas uma exaltação do próprio ego do diretor, que sempre quis dirigir algo com essas referências. E nessa causa de querer se divertir, Tarantino acaba divertindo a nós também (mas não a maioria que, como já disse, podem – e vão – odiar).
É também muito divertido identificar algumas referências da cultura-pop que estão inclusas no filme (como por exemplo, a música e a máscara do seriado Besouro Verde e citações a Jornadas nas Estrelas) no decorrer do filme. E as tomadas de câmera e narrativas são puro anime (animação japonesa), o tempo todo.
“Kill Bill” tem todo um clima debochado, principalmente nas cenas de ação. Fica fácil perceber que a intenção foi fingir que estavam fazendo algo sério quando, na verdade, não estavam. É sangue pra tudo quanto é lado, jorrando aos baldes da melhor maneira que só os filmes chineses de kung-fu sabem fazer… e não há jeito: você acaba rindo. Claro que há partes pesadas, mas são poucas. As melhores, com certeza, são as cenas de flashback onde a “Noiva” (Uma Thurman) relembra os momentos em que estava sendo executada, e a sequência que mostra a origem da líder da Yakuza O-Ren Ishii (Lucy Liu, perfeita no papel), toda feita em animação japonesa, em um estilo nada convencional, bastante rabiscado.
E você pergunta: e o tal Bill do título? Sim, ele obviamente é o ex-chefe de Uma Thurman, mas o personagem quase não aparece. No máximo, uma das mãos dele quase o tempo todo, com a voz poderosa de David Carradine dando todo o clima de mafioso para o papel e só. Mesmo assim, é possível sentir a presença do personagem, quase palpável, mesmo quando a mão dele não aparece, tamanha a influência.
Todos estão memoráveis em seus papéis, com cada ator e atriz tendo seus momentos na hora de roubar a atenção do público. Trabalhando para Bill, há um grupo de assassinos do qual a personagem de Uma fez parte e, durante o filme todo ela, corre atrás de um por um para matá-los antes de chegar em Bill (coisa que só vai acontecer no segundo filme, óbvio!). E são justamente esses personagens que tornam o filme tão carismático. Dentro desse grupo, além de Lucy Liu, os destaques merecidos são Chiaki Kuriyama, no papel da psicopata guarda-costas de Ishii (meu personagem preferido do filme) e para Darryl Hannah no papel de Ellen Driver, mulher de confiança de Bill.
Resumindo, é uma homenagem de Tarantino a dois gêneros de filmes que ele sempre gostou muito, misturados em um divertido, empolgante e engraçado filme de ação. Vá sem expectativas, com um saco de pipoca numa mão e um refrigerante na outra que fica tudo certo.
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