Na época dos hippies, do som psicodélico e das discotecas, o jogo de alienígenas mais famoso da história apareceu! É… No final dos anos setenta, Space Invaders virou febre e fez a cabeça da molecada, dividida entre a novidade eletrônica e os discos de vinil.
Nos dias atuais, Eduardo Mello, 32 anos, analista de sistemas natural de São Paulo, programou – sozinho e de forma inédita – uma versão do tão cultuado jogo, mas desta vez para um sistema de video game clássico: o ColecoVision. E isso não é tudo, pois ele está lançando o jogo!
Saibam mais a respeito dessa peripécia nesta entrevista exclusiva d´A ARCA!
A ARCA – Eduardo, como surgiu sua paixão pelos video games antigos? Você teve algum na época em que chegaram ao Brasil, em 1983?
Eduardo Mello: Meu primeiro contato foi com máquinas de arcade (fliperama). Eu morava em uma pequena cidade do interior e às vezes ia com amigos num bar que existia no centro, onde tinha um “fliperama” no fundo (bem ao estilo “antro de maconheiro”). Lembro-me de ver Donkey Kong e Kangaroo. Isso foi em 82, eu acho. Mas meu negócio na época era cinema, e eu nunca jogava, só olhava. Então, em meados de 83, joguei um video game pela primeira vez na casa de um amigo. Ele tinha um Atari VCS e um ColecoVision. Fiquei doido, joguei The Empire Strikes Back por umas quatro horas sem parar. Daí, adivinhem o que eu pedi de natal…
AA – Quando e porque se decidiu por criar um jogo para um video game antigo? Por que o Space Invaders e não qualquer outro?
EM: Eu sempre tive esse sonho, desde que ganhei meu primeiro video game (um Atari2600). Na escola eu tinha uma empresa de “mentirinha” com um colega. É claro que eu não podia produzir nada por falta de conhecimento e pela ausência de uma plataforma que fosse programável. Decidi, então, que queria um computador, um Atari 800. Mas acabei comprando um MSX, uma escolha que se mostrou bem mais adequada. Na verdade, eu nunca programava muita coisa, pois achava mais interessante jogar. Com o fim da era dos jogos 2D tradicionais, comecei a me desencantar um pouco com as últimas novidades e fui me interessando por coisas mais antigas, simples. Comecei a colecionar jogos de Atari 2600 e me interessar por tudo que dizia respeito a esse período específico dos video games. Pensei então em criar alguma coisa para o 2600, mas desisti depois que descobri como a máquina é limitada (mais até do que eu tinha imaginado). Foi então que me lembrei que o ColecoVision era muito parecido com o MSX em termos de hardware e que eu poderia reaproveitar todo o meu conhecimento. Como eu adorava jogos clássicos de arcade, resolvi que meu primeiro jogo seria a conversão de um fliperama. Tinha que ser algo relevante e simples para começar, por isso escolhi Space Invaders, que considero o primeiro grande “hit” dos video games.
AA – Quanto tempo levou para o jogo ficar pronto? Conte tudo para nós!
EM: Space Invaders foi produzido em fases. Comecei quando estava na faculdade, em 1997. Trabalhei nele durante uns seis meses até ficar jogável (mas ainda sem som e com muitos bugs). Nisso, John Dondzila, também programador, lançou o Space Invasion. Até então eu não tinha pensado em “lançar” o jogo como algo comercial e tal. Só queria vê-lo funcionando. Mas quando o Dondzila lançou-o, fiquei um tanto perplexo. Por um lado comecei a perceber que existia um mercado – mesmo que bem pequeno – para esse tipo de coisa. Porém, fiquei chateado por tê-lo lançado na minha frente! A partir daí decidi que precisava ter um diferencial. Descobri que Space Invaders tinha uma continuação, chamada de Space Invaders Part II ou Deluxe. Resolvi incluir a continuação no meu projeto e rebatizei o jogo de Space Invaders Collection Pack. Fiz alguma programação preliminar na continuação, mas abandonei o jogo por um longotempo. Em 2002 resolvi retomá-lo e após oito meses o jogo estava terminado.
AA – As versões finais dos jogos já foram testadas? Quais as opiniões dos gamers?
EM: Já foram jogadas, sim. Agora, não acho muito correto que eu diga o que as pessoas acharam. Joguem e tirem suas conclusões! Entretanto, existem reviews deles nestes sites:
– www.digitpress.com/reviews/spaceinvaderscoleco.htm
– grblitz.overclocked.org/colex2.htm
AA – Como você compara a sua versão à versão do arcade? Está fiel? O que dizer das versões dos outros consoles clássicos, como a do Atari 2600, por exemplo?
EM: Está tão fiel quanto foi possível para o ColecoVision. Comparando-se o nível de fidelidade com outras versões de oito bits, ele certamente bate todas, seja a do SG1000, a do MSX, a do NES, a do Atari 5200 e, claro, a do Atari 2600. Obviamente, isso não quer dizer que seja – necessariamente – mais divertida. Mas se você gosta da versão do fliperama, certamente gostará da minha.
AA – Quais as suas ambições? Criou o jogo para “ganhar dinheiro” ou por puro prazer?
EM: Bom, com o tempo minhas pretensões foram aumentando. Desde que retomei o projeto, comecei a pensar grande. No início eu ainda era estudante e não tinha nenhum dinheiro. Agora posso investir mais no jogo. Encomendei etiqueta, manual e caixa impressos em off-set, e também um molde para injeção dos cartuchos plásticos. É um bocado de dinheiro. Mas a tiragem é limitadademais para se pensar em ganhar dinheiro.
AA – Quem detém os direitos autorais sobre o Space Invaders? Não receia sofrer algum tipo de represália?
EM: Space Invaders é um jogo da Taito Corporation, e eles ainda detêm os direitossobre ele. Entretanto, esse é um lançamento de cunho hobbista e não comercial. É como um tributo, uma homenagem. Um fã de Star Wars não será processado por produzir desenhos de seus heróis favoritos e distribuí-los para os amigos, certo? Isso, inclusive, ajuda a divulgar o filme. Penso que o caso aqui seja o mesmo. Existe um nicho para esse tipo de jogo, que é formado por fãs bem “hardcore”. São pessoas, normalmente, na faixa dos trinta anos ou mais, que têm dinheiro para consumir e são formadores de opinião. Acho que seria péssimo para a Taito se tomasse qualquer atitude que desagradasse a esse grupo…
AA – É fácil programar os consoles antigos? Qual a maior dificuldade? Existe material de referência, livros?
EM: Depende do ponto de vista. Hoje em dia temos muitas ferramentas que tornam o processo de programar um jogo bem mais fácil. Todos os sistemas modernos possuem kits de desenvolvimento que mascaram os detalhes de hardware. Tudo é abstraído e pouca gente sabe como dada máquina realmente funciona. Por outro lado, os consoles antigos tinham arquitetura muito mais simples, o que permitia (ou, até mesmo, exigia) que se programasse o aparelho num nível bem baixo, explorando e acessando todos os recursos diretamente. Obviamente, essas máquinas são muito limitadas e a maior dificuldade é aprender a conviver com essas limitações. Mas boa documentação pode ser encontrada na Internet, principalmente para o 2600 e para o ColecoVision.
AA – Você acha que os programadores dos jogos de outrora (do Atari, do Odyssey, do Intellivision, etc.) eram mais criativos do que os de hoje? Como vê isso?
EM: Acho um pouco injusto esse tipo de comparação. O que acontecia era que a indústria estava em sua infância e cada projeto envolvia pouco dinheiro. A grande maioria dos jogos eram desenvolvidos por uma única pessoa trabalhando durante uns seis meses. Qualquer um podia abrir sua softhouse, e se um jogo não vendesse bem, não se perdia muito dinheiro. Havia muita experimentação e era permitido arriscar. Agora os jogos são mega-produções, envolvem dezenas depessoas trabalhando por mais de um ano e custam até milhões de dólares. Não é possível mais arriscar. Por isso temos tantos clones e continuações.
AA – Além de programador, você também é colecionador de video games antigos, certo?
EM:Bem, sou um grande admirador dos video games clássicos. Acredito que eles tiveram um profundo impacto em nossa sociedade; marcaram o início da revolução digital. É fascinante saber como tudo começou, como a indústria era ingênua, como tudo tinha um certo frescor e parecia ser original. Minha maior preocupação, como colecionador, é tentar preservar essa história.
AA – Como pretende preservar a história do video game? Explique melhor.
EM: Sempre achei que preservar objetos e documentos fosse o mesmo que preservar a história. Do contrário, por que os museus estariam repletos de coisas antigas? Para mim, cada jogo e a respectiva embalagem falam por si; são história viva, reflexo de um momento da história humana.
AA – O que você diria para alguém que também queira criar jogos para um console clássico?
EM:Boa sorte! É tudo uma questão de dedicação e amor pelo hobby.
AA – Quais são seus próximos projetos? Você toparia criar um jogo para um videogame moderno?
EM: Atualmente estou trabalhando em uma outra conversão de arcade para o ColecoVision: Pac-Man Collection. A idéia é ter Pac-Man e Ms. Pac-Man reunidos em um único cartucho. Após isso, talvez venha Donkey Kong Collection ou talvez um jogo original, ainda não estou bem certo. Já pensei em trabalhar com videogames atuais, mas isso exigiria dedicaçãointegral. Considerando-se que o mercado de games sempre foi muito instável, prefiro a segurança do meu atual emprego!
AA – Para finalizarmos: qual público comprará o cartucho Space Invaders? Há fãs no Brasil ou apenas os estrangeiros o comprarão? Afinal, não se acha mais ColecoVisions para compra, hoje em dia, com a mesma facilidade de antigamente… A pessoa que queira adquirir o cartucho, como deve proceder?
EM: Bem, não acho que exista público definido. Qualquer um, de qualquer lugar, pode comprar uma cópia, se quiser. Quanto ao ColecoVision, basta dar uma olhada no eBay, o maior site de leilões da Internet.
O interessado deve enviar um e-mail para mim – sales@opcodegames.com – e informar o seu nome, e quantos cartuchos quer. O preço dele é de US$ 25 por cartucho, mais o valor do envio (que deve ser algo em torno dos R$ 10,00 – aqui no Brasil). Existe um site provisório aos que desejarem mais informações: www.geocities.com/vgbelloq.
AA – Eduardo, nós d´A ARCA lhe desejamos sorte! Sucesso! E parabéns pela aventura!
Quer conhecer mais sobre o ColecoVision? Veja a minha matéria aqui n´A ARCA ou então acesse: www.colecovision.kit.net
|