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Mal tinha acabado de assumir os combalidos roteiros da revista do Homem-Aranha, sendo colocado à prova por uma legião de exigentes e mal-tratados fãs (entre os quais eu me incluo), o roteirista J.Michael Straczynski, criador do seriado Babylon 5, recebeu uma verdadeira bomba das mãos do editor-chefe Joe Quesada: mostrar como o herói aracnídeo, um dos mais bem-humorados personagens da editora, iria reagir à tragédia do dia 11 de setembro. Afinal, o Aranha é o nova-iorquino típico: defensor urbano, ele sempre combateu o crime nas ruas da Grande Maçã. O resultado foi lançado na Brasil pela Panini Comics na forma de uma bela edição especial, exatamente no aniversário de um ano dos atentados que derrubaram as Torres Gêmeas.
E o resultado não decepciona. Straczynski evita os já esperados clichês patrióticos aos quais os americanos recorrem comumente e fala sobre as vidas que se perderam, não importando a nacionalidade à qual elas pertenciam. Afinal, o sofrimento não tem pátria e nem bandeira. A discussão política fica em segundo plano, pois esta é uma celebração às vítimas e aos heróis que morreram tentando salvá-las. Não importa quem são os culpados: se os terroristas árabes querendo punir a nação americana ou se os próprios Estados Unidos, que estariam colhendo os frutos de sua própria política exterior agressiva. Não importa, na verdade. O autor não lhes dá nomes e nem rostos. "O que dizer às crianças?", pensa o Homem-Aranha. "Que o mal é um rosto estrangeiro? Não. O mal é o pensamento por trás do rosto, que pode ser como o seu".
Além do Aranha, outros heróis dão as caras no gibi: Ciclope, Wolverine, Tempestade, Demolidor, Senhor Fantástico, Coisa, Thor, Feiticeira Escarlate, Visão, Gavião Arqueiro e o Capitão América (por sinal, protagonista de um dos momentos mais tocantes da história). Mas a presença dos uniformizados, sempre tentando se desculpar por não ter conseguido chegar à tempo, acaba apagada pelos verdadeiros heróis desta tragédia, os policiais, bombeiros e membros das equipes de resgate que penetraram nos escombros do WTC e perderam suas vidas para salvar muitas outras. "Mas com nossos uniformes e poderes, ficamos pequenos diante dos verdadeiros heróis. Aqueles que enfrentam o fogo sem medo nem armadura", explica o alter-ego de Peter Parker.
Parabéns não só ao talentoso J. Michael Straczynski pela qualidade do texto, mas também à Marvel Comics pela coragem da iniciativa, evitando fugir da responsabilidade e trazendo uma das maiores tragédias da história para as páginas de seus gibis, amadurecendo e fazendo seus heróis e vilões crescerem de verdade.
PS: Tenho só uma ressalva – achei desnecessária a presença dos super-vilões na história, surgindo como se também estivessem tocados pela tragédia. Vamos ser sinceros: todos eles são seres perigosos e impiedosos. Talvez o Rei do Crime, por também ser um nova-iorquino típico, ou mesmo o Dr.Octopus, um cientista, até se entendam… Mas o Magneto, um terrorista capaz de cometer uma atrocidade ainda pior do que esta em nome de sua causa? Ou o Dr.Destino, que busca a dominação mundial a qualquer custo? Um pouco forçado demais, eu diria…
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