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Sonhar em se tornar um astro das histórias em quadrinhos não era algo tão complicado há algumas décadas quanto é hoje. Atualmente, temos muitos livros sobre o assunto, internet e mais trocentos meios de descobrir os segredos de como fazer uma boa HQ. No entanto, ainda são poucos os candidatos que têm a determinação necessária pra tal. Foi pensando nisso que eu parei e refleti: “Pô, sempre que vejo uma entrevista de um profissional da área, já é uma estrela. Ninguém vê os caras beeeeeem no começo da carreira”. Em seguida, garimpei meus contatos e cheguei ao arte-finalista Jorge Correa Junior, um singelo rapaz de São Paulo que há pouco tempo estreou nas editoras americanas. Aqui nessa entrevista, descobrimos como é o começo de carreira de uma, quem sabe (e eu torço pra isso!), futura estrela dos quadrinhos. Seus sonhos, suas experiências e coisas do gênero. Bom, sem mais enrolação, vamos conhecer o Jorge…
A ARCA: Fale um pouco sobre você: seu nome, sua idade, sua profissão e como você começou a gostar de HQs…
Jorge: Bom, meu nome é Jorge Correa Junior, tenho 24 anos e atualmente estou trabalhando como arte-finalista pro mercado americano. Eu não me lembro direito como foi que comecei a gostar de HQs, mas lembro que comecei a ler HQ de heróis por causa do Homem-Aranha.
A ARCA: Você começou trampando para a finada Chaos Comics, não foi? Em que revista? Quais eram os profissionais envolvidos?
Jorge: Foi exatamente pra Chaos!!! Meu primeiro serviço foi um tapa buraco pra revista Bad Kitty, foram 6 páginas sobre o lápis do Carlos Mota. Foi na revista Bad Kitty Mischief Night #1, em setembro do ano passado.
A ARCA: E quando foi que você percebeu que era com quadrinhos que você queria trabalhar? Teve influência de alguém ou foi algo ao acaso?
Jorge: Eu sempre quis trabalhar com desenho. Inicialmente eu pensei em publicidade, até o dia que eu li o bendito Homem-Aranha e fiquei facinado por quadrinhos! Eu pensava que seria impossível trabalhar com super heróis, porque era coisa dos americanos, mas depois de algum tempo fiquei sabendo dos artistas brasileiros que conseguiram entrar para o mercado e corri atrás disso.
A ARCA: Desde então, como têm sido sua corrida atrás de seu objetivo? Fez algum curso?
Jorge: Fiz 3 cursos, mas na verdade só 2 me adiantaram de alguma coisa, sendo o último (na Fábrica de Quadrinhos) de maior importância, porque era um curso especializado em HQs com professores que trabalhavam com isso. O primeiro curso que fiz foi em uma escola que acho que nem existe mais, chamada Nobel, onde fiz publicidade; o segundo foi na ABRA, onde eu aprendi coisas muito importante como perspectiva, anatomia, luz e sombra e técnicas de pinturas, entre outras. Mas foi na Fábrica que eu me especializei, principalmente com os toques do Ivan Reis e do Marcelo Campos, que foram meus dois professores.
A ARCA: E dentro dessa área de HQs? O que foi que você fez antes de entrar na Chaos?
Jorge: Bom, meu primeiro trabalho publicado foi como arte-finalista em uma história chamada Dinastia para uma revista extinta chamada HQ: A Revista do Quadrinho Brasileiro, da editora Escala. Depois, como desenhista, fiz duas histórias de uns personagens chamados Paracorps. Na mesma revista, também finalizei duas histórias chamadas de Involução.
A ARCA: E como foi fazer o teste pra uma grande editora como a Chaos? Como foi o processo?
Jorge: Na verdade, eu não fiz teste! Meu teste foi a Bad Kitty, e prá falar a verdade, fiquei… como posso dizer… com o “c” na mão!
A ARCA: Seu teste foi aquele tapa-buraco logo de começo?
Jorge: Exatamente!!! Por isso fique com medo de fazer cagada no trabalho e não conseguir mais nada, sabe? Mas esse tapa buraco caiu do céu!
A: Então eles gostaram mesmo do seu trabalho e já pegaram você pra trabalhar…
Jorge: É, logo depois disso, uns 2 meses depois eu assumi Lady Death, junto com o Carlos Mota.
A ARCA: Você fala da revista mensal da Lady Death? Ou das mini-séries?
Jorge: Pra falar a verdade eu não entendo direito o sistema de publicação da Chaos, mas essa revista que eu fiz foi um único numero e depois nós fizemos uma mini série em 4 edições ainda inédita! Agora eu estou fazendo uma mini-série chamada Dungeons & Dragons B&W, para uma editora pequena.
A ARCA: Baseado no famoso jogo de RPG?
Jorge: Acho que mais ou menos baseado no jogo. Eu não conheço muito bem Dungeons & Dragons… quer dizer, não sei se os personagens são os mesmos.
A ARCA: Bom, e como foi quando você recebeu a notícia de que a Chaos havia gostado do seu trabalho? Qual foi a sensação?
Jorge: Cara, é sempre muito legal receber elogios, principalmente de editores que não são muito de fazer isso. Mas foi uma sensação muito boa!
A ARCA: E como foi trabalhar com eles? Além da experiência, claro. Por exemplo: se eles pagaram bem e no dia certo; como foi o contato com os editores…
Jorge: Além da correria, foi muito legal! Eles pagam um valor bom por página. Contato com editor eu nunca tive, a não ser e-mails encaminhados pelo meu agente.
A ARCA: Quanto eles pagavam (pra atiçar os aspirantes a profissionais, hehehehe)?
Jorge: Ih cara, eu tenho que falar mesmo??? (risos)
A ARCA: Pela ética, não precisa falar um valor exato, mas poderia nos dar uma idéia?
Jorge: Ok. Algo entre U$$80 e U$$100.
A ARCA: E como está sendo trabalhar para as editoras americanas? Quais seriam os pontos fortes e os pontos fracos?
Jorge: É bem legal, porque o grande mercado de HQ é lá nos EUA e trabalhando pra eles você tem mais chance de ter o trabalho reconhecido e possivelmente pegar títulos mais importantes em editoras maiores. Os pontos fracos? Não sei, acho que é só a correria e prazos apertados ou estourados.
A ARCA: E o Carlos Mota? Como foi trabalhar com ele? Ele gostou do seu trabalho? Vocês conversaram durante a realização das páginas?
Jorge: Foi muito bom trabalhar com ele! Ele é um ótimo desenhista e seu traço é muito preciso, o que facilita a arte-final. Ele me ligou várias vezes pra elogiar meu trabalho e também para dar alguns toques. Apesar de conversarmos bastante, eu não o conheço pessoalmente, apenas por telefone. Afinal, ele mora no interior e eu na capital. Ele é muito gente boa.
A ARCA: E sua rotina de trabalho, como é? Com prazos apertados, você deve correr muito…
Jorge: Aí vai depender do tamanho do aperto (risos). Essa última revista da Lady Death, eu cheguei a fazer 3 páginas em um dia, assim, acordando 8hrs e indo dormir às 3 da matina!
A ARCA: Aí é meio que escravidão, não?
Jorge: Concordo. E o pior é que, se você atrasa mais, o errado é você, sendo que o prazo já vem estourado pro desenhista e que também vem estourado pra mim… Mas isso aconteceu só uma vez. Geralmente é mais sossegado.
A ARCA: Que bom! Falando um pouco dessa parte técnica, qual o tipo de material que você usa? Tem algum nanquim ou pincel especial ou alguma outra coisa do gênero?
Jorge: Eu aconselho a usar material de boa qualidade, que não seja muito caro, embora esse tipo de material não costuma ser barato! Cada artista tem sua preferência. Eu particularmente uso um nanquim alemão, um pincel francês, várias canetas nanquins de espessuras diferentes, curvas franceses de tamanhos diferentes, diversos gabaritos de elipses e círculos, além de guache branco.
A ARCA: Que tipo de coisas você quer fazer mais pra frente numa editora?
Jorge: Não sei ao certo. Eu quero me tornar desenhista e, quem sabe, ser as duas coisas, desenhista e arte-finalista de um personagem importante de uma editora também importante…
A ARCA: Ainda sobre sua carreira, com quais profissionais você gostaria de trabalhar?
Jorge: Como arte-finalista, queria trampar com Ivan Reis e Roger Cruz. Já se eu fosse desenhista, queria trabalhar ao lado de Frank Miller, com arte-finalistas do naipe de Joe Pimentel e do Marcelo Campos.
A ARCA: Falando em personagens, quais são os seus preferidos? Um já é o Aranha…
Jorge: Além do Aranha, eu gosto do Batman e comecei a gostar do Demolidor e do Thor, que estavam com histórias e a arte bem legais.
A ARCA: Qual é o seu ponto forte quando passa a tinta? E o que você acha que tem que melhorar no seu trabalho?
Jorge: Meu ponto forte acho que é a variação de espessura que aplico nos traços. Cara, eu tenho muito o que melhorar em meu trabalho, sei lá, desenvolver técnicas novas, ser mais “ousado”.
A ARCA: O que quer dizer com “ousado”?
Jorge: Arriscar a fazer efeitos, usar materiais diferentes, técnicas diferentes, essas coisas.
A ARCA: Você é um profissional iniciante no mercado americano. O que foi mais difícil pra você até conseguir um lugar nesse mercado de trabalho concorrido?
Jorge: Acho que chegar a um nível exigido por eles…
A ARCA: Uma das coisas que se faz nesse campo é a pesquisa. Você faz algum tipo de pesquisa na hora de trabalhar? Livros, internet, alguma coisa?
Jorge: Eu uso bastante a internet quando não encontro o que preciso em livros. Referência é muito importante pra quem desenha, acredito que esse é um dos pontos que diferencia um profissional de um, digamos, amador…
A ARCA: E o que você aconselharia pra alguém que está onde você esteve, ou seja, batalhando pra entrar numa grande editora?
Jorge: Desista! (risos) Brincadeira, pessoal. Insista. É isso, insistir, e não desistir!! No começo é dificil prá caramba. Você vai levar vários “não” na cara, então o negócio é ter persistência. Um dia você consegue e, conseguindo, não estacione pensando que você não precisa aprender mais nada: continue pesquisando para melhorar seu trabalho, você sempre tem algo pra aprender!
A ARCA: Seu irmão é desenhista, não? Como é ter alguém próximo pra compartilhar experiências e aprender mais?
Jorge: É uma mão na roda. Nós sempre pedimos opiniões um para o outro e é muito bom porque, às vezes, a gente não consegue enxergar onde está o erro no desenho e, tendo alguém que entenda do assunto por perto, ajuda muito!
A ARCA: Para finalizar, você acha que um dia os profissionais e os fãs de quadrinhos irão presenciar um mercado brasileiro tão bom quanto o americano?
Jorge: Olha, é complicado dizer, mas eu espero que sim!
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